Antônio Novais Torres
Deoclides Ferreira das Neves, conhecido como Dió da pensão Primor. “Analfabeto de pai e mãe”, como diz o linguajar popular, porém famoso pelas qualidades e versatilidades culinárias e por seus inigualáveis temperos. Um verdadeiro mestre-cuca de inteligência intuitiva.
Deoclides nasceu em 08/08/1897, em Piatã, filho de Luzia Ferreira das Neves, nascida em 10/06/1860, em Livramento/BA. Casou-se em 06/10/1922, com Blandina de Oliveira Meira, nascida em 10/12/1907 e filha de Maria Angélica de Oliveira Meira, nascida em 08/06/1884.
Dió trabalhou em vários lugares: Contendas do Sincorá, Fazenda Poções situada nos Olhos d’Água de Deô, com João Pedro de Lima, e depois, aportou na Fazenda Tocadas, de propriedade de Teófilo de Lima. Posteriormente veio para Brumado, aqui se estabeleceu com pensão, inicialmente na Rua Exupério Canguçu e depois na Praça da Bandeira (Praça da Matriz), atual Praça Capitão Francisco de Souza Meira, com a Pensão Primor. Posteriormente se estabeleceu com prédio próprio na Rua Grande, hoje, Cel. Tibério Meira, na qual se hospedaram personalidades ilustres, incluindo políticos de prol. Entre eles o professor Anísio Teixeira – Ministro da Educação e grande pensador, Dr. Lomanto Júnior – Governador do Estado da Bahia, Ovídio Teixeira – Senador da República, Dr. Vasco Neto – Engenheiro e Deputado, Pedro Moraes – avô do Governador da Bahia e o próprio Nilo Coelho – Governador da Bahia e tantas outras personalidades. Eram mensalistas pessoas do nosso convívio Edvaldo Ataíde, os irmãos Sidney e Ubaldo Meirelles, respectivamente, bancário, promotor público e odontologista, entre outros.
A pensão Primor era ponto de encontro, geralmente à noite, para uma estirada de prosa, adentrando a madrugada, um bate-papo saudável, diversificado e informal. Deoclides Ferreira das Neves, o nosso querido e saudoso Dió, apesar de analfabeto, era um homem espirituoso e inteligente. Versado em temas políticos, entusiasta peemedebista e apaixonado pelo partido, era eleitor de “Admundo” – prefeito Edmundo – e admirador de doutor “Danta” – o médico e político Dante Guedes, ambos, filiado ao PMDB.
Naqueles tempos de Intendentes e de Coronéis mandantes, não havia meios de comunicação que funcionassem com a rapidez e a frequência de hoje. As notícias chegavam por intermédio dos visitantes ilustres e dos viajantes que traziam as gazetas da capital, sempre com grande atraso. Dió após ouvir a leitura e os comentários de seus hóspedes se encarregava de transmiti-las aos amigos, especialmente na feira livre.
O Major Aurélio, político de prestígio e influência local era um dos primeiros a serem informados das novidades e, por sua vez, transmitia ao “comunicador” as últimas notícias locais de seu interesse, com a certeza de tê-las assim “anunciadas”, concretizando os seus objetivos políticos.
Quando ia à feira, manhãzinha, antes de o sol nascer, para comprar carne fresca de bode, levava consigo uma gamela de madeira que usava para o acondicionamento das compras a serem usadas no preparo alimentar. Uma das suas especialidades era o ensopado de bode, cujo tempero fazia a diferença. Na feira fazia a divulgação das notícias ouvidas de seus hospedes e as do cel. Aureliano.
Dió, por quem nutríamos estima e consideração, foi um grande amigo, de meu pai Flavinho e meu. Ele costumava retribuir os elogios e cumprimentos que recebia sempre com a mesma resposta: “O mesmo tanto lhe ofereço; nem mais, nem menos” e outras de seu repertório. Em diversas situações proferia provérbios como “Cavalo corredor rédea curta”, “Papagaio come milho, periquito leva a fama”, etc. Crítico dos desvios da conduta e do comportamento sociais das famílias, tendo uma filha que, por descuido, engravidara, quando maldosamente alguém perguntavam notícias da filha, com o intuito de humilhá-lo os brios, filósofo dizia: “Quem tira virgindade de moça é cabeça de menino, enquanto não parir para mim é moça”.
Figura ímpar, honrada e honesta, de muitas amizades, merece o nosso respeito e reverência. Foi um cidadão importante e de destaque na comunidade brumadense do seu tempo. Não pode ser esquecido pela sociedade à qual serviu, honrou e dignificou com sua personalidade de homem simples e humilde, que prestou um serviço inestimável à cidade de sua opção para viver.
Era analfabeto, não por escolha ou vontade, mas por falta de oportunidades e de incentivos que lhe foram subtraídos, como sói acontecer neste Brasil injusto, de tantos caciques políticos e tantos líderes (vaqueiros humanos) que pouco se têm preocupado com o povo humilde e pobre. Este fica à mercê das esmolas dos programas sociais quando, na verdade, necessita é de trabalho digno, de educação, de trabalho e da promoção social que o dignifiquem.
Aliás, os governantes e as elites dominantes não têm demonstrado interesse em instruir o povo, porque necessitam dele como massa de manobra, pois povo educado tem consciência de seus direitos, é reivindicador – incomoda.
Muito bem informado, Dió faleceu aos noventa anos, em oito de agosto de 1988, em sua residência na rua Cel. Tibério Meira, cercado de amigos e familiares que lhe prestaram a última homenagem. Encontra-se sepultado no cemitério municipal Senhor do Bonfim.
(*) Deoclides Ferreira das Neves – 08/08/1897-08/08/1998.



sjpr5m
Your blog is a constant source of inspiration for me. Your passion for your subject matter is palpable, and it’s clear that you pour your heart and soul into every post. Keep up the incredible work!
tcjduy
yzxroh